Os Poderes Executivo e Legislativo da União criaram uma série de normas especiais para combater a pandemia decorrente do novo Coronavírus (COVID-19), de modo a flexibilizar regras fiscais, administrativas e financeiras e tornar mais ágil a resposta estatal à crise sanitária e econômica. Exemplo disto são as novas regras para contratação de bens e serviços pela Administração Pública durante o período de calamidade pública.
A primeira medida legal de maior impacto adotada pela União nessa seara se deu com a edição da Medida Provisória nº 926 de 20 de março de 2020, que alterou profundamente a Lei nº 13.979/2020 e estabeleceu uma série de medidas para flexibilizar procedimentos licitatórios e autorizar a contratação direta de bens, serviços e insumos na área da saúde diante do cenário de pandemia. Dentre as medidas, destacam-se: (i) a dispensa de licitação para aquisição de bens, serviços e insumos ao enfrentamento da crise; (ii) a dispensa de estudos preliminares, projeto básico simplificado e apresentação de documentos relacionados a requisitos de habilitação; (iii) a permissão para contratação de empresas com inidoneidade declarada ou suspensão do direito de participar de licitação quando se tratar da única fornecedora do bem ou serviço; e (iv) a previsão de que os contratados ficam obrigados a aceitar, nas mesmas condições contratuais, acréscimos ou supressões ao objeto do contrato, em até 50% do valor inicial.
Na última semana, mais duas medidas foram implementadas. A Medida Provisória nº 961 de 6 de maio de 2020 autorizou que a administração pública de todos os Entes federativos, Poderes e Órgãos constitucionalmente autônomos: (i) utilizem como limites orçamentários para dispensa de licitação os valores de R$ 100.000,00 (obras e serviços de engenharia) e R$ 50.000,00 (outros serviços, compras e alienações), em complemento à MP 926 que já previa a possibilidade de dispensa de licitação para aquisição de bens e serviços destinados a enfrentamento da pandemia; (ii) promovam o pagamento antecipado quando representar condição indispensável para obtenção do bem ou a prestação do serviço ou propicie economia significativa de recursos; e (iii) apliquem, durante o período da pandemia, o Regime Diferenciado de Contratações (RDC), previsto na Lei nº 12.462/2011, à época editada sobretudo para contemplar os compromissos assumidos pelo país para servir de sede aos eventos esportivos mundiais, para toda e qualquer contratação.
Por fim, o Congresso Nacional, no dia 7 de maio, promulgou a Emenda Constitucional 106/2020, conhecida como “Orçamento de Guerra”. A referida emenda confere status constitucional às medidas de enfrentamento da crise sanitária e provê o Poder Executivo de instrumentos mais eficazes para enfrentar o período de calamidade pública. Dentre os instrumentos previstos no “Orçamento de Guerra” relacionados às contratações públicas temos (i) a autorização para o Poder Executivo Federal adotar processos simplificados de contratação de pessoal e de obras, serviços e compras, com o propósito exclusivo de enfrentamento do contexto da calamidade e de seus efeitos sociais e econômicos, dispensada a observância do § 1º do art. 169 da Constituição Federal na contratação de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal; e (ii) a autorização para que pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social possa contratar com o Poder Público e receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, tornando temporariamente ineficaz o § 3º do artigo 195 da Constituição Federal.
Todas as medidas mencionadas acima são temporárias e permanecerão vigentes tão somente enquanto perdurar o estado de calamidade pública, além de não afastarem a tutela dos órgãos de controle. A sua adoção exige atenção redobrada do administrador e daqueles que contratam com o Poder Público às hipóteses previstas, porque embora sejam essenciais para facilitar a atuação estatal nesse período, as novas regras são excepcionais e devem se restringir ao combate à pandemia. Afinal, prudência e canja de galinha não fazem mal a ninguém.