No julgamento do ARE nº 1294969, objeto do Tema nº 1124 da repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal reafirmou sua jurisprudência dominante, fixando como tese que “O fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, que se dá mediante o registro”.
A decisão elimina dúvidas quanto ao marco temporal de incidência do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, ou seja, o momento em que o fato gerador deve ser considerado como consumado para, então, ser devido o pagamento do imposto.
O artigo 156, II, da Constituição Federal, que atribui competência dos Municípios para instituição do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, determina que o tributo será devido nos casos em que houver “transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”.
Embora o texto constitucional sempre tenha fixado como fato gerador a transferência da propriedade, havia uma incerteza acerca do momento em que o imposto seria devido pelo contribuinte.
Esta controvérsia era maior no caso de cessão de direitos de compra e venda dos imóveis, terceira parte do art. 156, II, da Constituição Federal.
No julgamento do ARE nº 1294969, o Município de São Paulo defendia a tese de que o compromisso de compra e venda seria considerado um negócio intermediário, “a qualquer título”, entre a celebração do compromisso em si (negócio originário) e a venda a terceiro comprador (negócio posterior) razão pela qual, nos termos do artigo 156, inciso II, da Constituição Federal, tornava o registro em cartório irrelevante para a incidência do imposto.
Em que pese o apetite tributário do ente municipal, o presidente do STF ministro Luiz Fux, Relator do recurso, manteve o posicionamento do Tribunal de Justiça de São Paulo e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ao dispor que não se admite a incidência do tributo sobre bens que não tenham sido transmitidos.
Em suma, o pagamento do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) só será devido a partir do registro da transferência da propriedade imobiliária perante o cartório do Registro de Imóveis (“RGI”), sendo irrelevante a existência, para fins de incidência do tributo, de cessão de direitos sobre o imóvel.
E, por coerência, também não seriam devidos eventuais acréscimos (juros e multa) lançados junto com o imposto de transmissão no caso em que ainda não tenha ocorrido a transmissão efetiva do imóvel, com o seu registro no RGI.
Supremo Locuta Causa Finita. Sobretudo em tema de repercussão geral. Assim deveria ser. Em um estado de direito. Causa espécie que ainda exista resistência por parte das Prefeituras para cobrança do imposto no momento adequado do registro da transmissão efetiva do imóvel. Causa maior espanto que os cartórios imobiliários também exijam o pagamento do imposto antes mesmo do registro da transferência, o que mantém o debate sobre o tema tumultuado, quando já deveria ser questão pacífica.
Não são poucas às vezes em que as operações de compra e venda são precedidas de escrituras de promessa em razão de parcelamento do preço, necessidade de regularização da propriedade ou, ainda, de documentação do imóvel. A gula tributária da Prefeitura pode até ser compreensível, embora seja equivocada e censurável. Incrível é a renitência dos cartórios de RGI que avançam no tempo e exigem o pagamento do ITBI, mesmo com parcelamento do preço ou com quitação do preço, antes mesmo do efetivo registro.
As autoridades fazendárias lançam o imposto de transmissão com cobranças retrospectivas, acrescidas de multa e juros moratórios, as quais, repita-se, como decidido pelo Supremo Tribunal Federal, somente são devidos com o efetivo registro de transmissão do imóvel.
Muitos já foram os casos em que se fez indispensável o ajuizamento de medida judicial para superar os equívocos e exigências ilegais da fazenda municipal e dos notários e registradores com a cobrança indevida e cumulativa de multa e juros moratórios, para efetivação e transferência da propriedade para o adquirente de um novo bem imóvel,
Os que não recorreram ao Judiciário optaram em sofrer o prejuízo e pagar multa e juros moratórios absolutamente indevidos. Só havia essas duas alternativas.
Agora, com essa decisão do Supremo Tribunal Federal, de repercussão geral, seja de bom alvitre provocar o Conselho de Registro de Imóveis do Brasil, CORI, para se manifestar, acolher e regular, por meio das associações estaduais dos registros de imóveis, o fim de exigências ilegais e inconstitucionais dos cidadãos e empresas, para por fim a cobranças de ITBI indevidamente retroativas, com multa e juros de mora.
Também é aconselhável provocar o CNJ para expedir regulamento específico aos cartórios de modo que, normativamente, cumpram a decisão do STF. Nada disso deveria ser necessário, basta a decisão do Supremo, mas no Brasil não custa lembrar ao Estado (Município) e aos Notários que habemus Legis, habemus Constituição e hambemus Supremo.